quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O Negro e a Mídia - a Invisibilidade da Co

O Brasil tem a maior população de origem africana do mundo. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os declarados negros representam 6,3% e os pardos 43,2% da população brasileira. Contudo, a presença desse segmento nos meios de comunicação – em especial no jornalismo, é muito pequena. De acordo com o último censo, realizado em 2000 pelo (IBGE), a proporção de negros na imprensa é de apenas 15,7 %.

Sobre a relação da mídia em relação aos interesses da população afrodescendente, o Pesquisador Sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da Universidade de Brasília - NEMP - UNB, Venício Lima, aborda a questão no site da Agência Carta Maior. A analise do pesquisador parte de uma pesquisa elaborada pelo Observatório Brasileiro de Mídia que revela o posicionamento contrário de grandes revistas e jornais brasileiros em relação aos principais pontos da agenda de interesse da (ações afirmativas, cotas, Estatuto da Igualdade Racial e demarcação de terras quilombolas).

Acesse o artigo aqui.


As atividades para a semana da consciência negra de 2009 foram preparadas com antecedência pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul. Foi realizado no dia 17 e 18 de setembro, através do Núcleo dos Jornalistas Afro-brasileiros, o 2º Seminário Estadual o Negro na Mídia - a Invisibilidade da Cor.

A temática escolhida para essa edição, Indicadores da Negritude e os Meios de Comunicação, proporcionou aos jornalistas, universitários dos cursos de Comunicação e Jornalismo e público em geral um repensar sobre as diferenças étnico-raciais, práticas de discriminação e racismo, a identidade e auto-estima da população negra brasileira.


O encontro detalhou os dados estatísticos divulgados pelos órgãos oficiais e institutos de pesquisas. Também foi possível fazer uma reflexão sobre o que significa para a mídia a informação de que o Brasil tem a maior população de origem africana fora da África.

Ainda foram objeto de debate os dados do IBGE onde os auto-declarados negros atingem o índice de 6,3% e os pardos, 43,2% da população brasileira, ou seja, 80 milhões de brasileiros. A pauta das questões étnicas raciais é uma discussão permanente entre os associados do Sindicato, viabilizadas nas atividades do Núcleo dos Jornalistas Afro-brasileiros.

O 1º Seminário O Negro na Mídia – a Invisibilidade da Cor ocorreu em novembro de 2004 e fez reflexões relacionadas à população afro-brasileira como um instrumento de sensibilização para os jornalistas no enfrentamento da discriminação racial. Já a sua segunda edição foi também uma ferramenta que possibilitou aos interessados usufruir de informações detalhadas sobre a população afro-brasileira, tais como mercado de trabalho, escolarização, habitação, saúde, mulheres e juventude.

Além disso, os debatedores do dia 18 de setembro foram: Eloi Ferreira de Araújo - Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial – Seppir; Esaud Noel - Presidente da Associação Nacional de Jornalistas Afrocolombianos – Colômbia; Ana Lucia Sabóia - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE e a analista de sistemas de informação do Equador, Sonia Ribeiro. O encontro teve a mediação de Cristian Guevara - Federação de afrodescendentes iberoamericanos - Fedafro – Espanha.

Cada um dos participantes falou de um assunto especifico, por exemplo, a equatoriana Sonia Ribeiro, falou sobre as estratégias de comunicação, a geração de informação e capacitação e também da coordenação e apoio técnico as instituições. Ou seja, dados técnicos.

Esaud Noel falou da situação de invisibilidade dos afrocolombianos na Colômbia e que por isso, muitos deles tendem a escolher carreiras de comunicação, mais especificamente, o curso de jornalismo para debater o assunto em seu país. Além disso, o jornalista destacou que o censo na Colômbia contabilizou no último ano, apenas 11% das pessoas que se consideram negras, mas para a Associação Nacional dos Jornalistas essa porcentagem é de 26%.

Ana Lucia Sabóia destacou a importância do censo no Brasil, a falta de veiculação na mídia sobre o tema, afirmou que preto é cor e negro é identidade e que as definições são divididas em negros e pardos, porém, nem todo o pardo é negro, porque existem misturas de asiáticos com brancos.

O mais polêmico debatedor do encontro foi Eloi Ferreira, segundo suas considerações, as cotas raciais são de direito dos negros. Também revelou que a votação feita pelos 13 deputados contra é um desserviço a legitimidade do negro na sociedade. Fez considerações sobre a falta de negros em comerciais de xampu, sabonete e condicionador.

Para mim, o único palestrante que realmente falou do tema foi o Secretario Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Eloi Ferreira de Araújo. O titulo do Seminário era O Negro na Mídia, não a quantidade de negros na Colômbia, o Censo no Brasil ou técnicas de informatização no Euqador.

Sendo assim, o foco deveria ser os problemas que os negros enfrentam na mídia. O que eles pensam disso? O que está sendo feito para melhorar esta dificuldade? Quais exemplos de superação são encontrados no meio? Por isso, o debate se apresentou sem aprofundamento, vago.

É correto dizer que o secretario mencionou alguns exemplos, porém, poucos. Outro problema foi à quantidade de perguntas destinadas aos debatedores: a maioria delas se destinou apenas ao secretario. Era como se o único palestrante fosse ele. Além disso, perguntas muitas repetitivas, não pertinentes.

Espero que o próximo seminário, se houver, seja mais aprofundado na questão. Pois, exemplos de indagações muitas existem no Brasil, tais como: a falta de negros como ancoras de televisão nos veículos de comunicação de TV aberta e a falta de mercado de trabalho para modelos negros em desfiles são alguns exemplos.


Para melhor repercutir esta questão, sobre o dia da consciência negra e a sua visibilidade na mídia, foi feita uma pesquisa com jovens negros sobre o assunto:

Enquete (Áudio)

Michele Mendonça acha importante um dia sobre a consciência negra.
Na opinião de Fabiana, falta mais divulgação sobre a data
Para Deise, nao deveria ter somente uma data, mas ser lembrado cotidianamente
Na opinião de Jaqueline não precisa de uma data para o movimento ser lembrado já que o mesmo faz parte da sociedade como um todo
Para Damiana o negro pode ser lembrado todos os dias
Daniela

Portanto, a maioria dos entrevistados considera que não deveria haver uma data para que o negro seja lembrado, e sim, todos os dias os negros devem ser lembrados. Quanto à visibilidade, todos consideram pouco o espaço dado aos negros, principalmente na TV, já que, na avaliação das pessoas entrevistadas, todos têm a mesma capacidade, sendo negro, branco, pardo ou índio.

Acompanhe abaixo um trabalho executado em Movie Maker sobre consciência negra:

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Os Movimentos Sociais e o espetáculo midiático

Há pouco tempo, os veículos de comunicação, em especial aqueles chamados de “massa”, veicularam em seus periódicos, canais de TV - como o caso abaixo – imagens da destruição de pés de laranjas, na fazenda Cultrale no interior de São Paulo, por integrantes do MST.

Na opinião da jornalista e professora Christa Berger (confira abaixo a entrevista com Christa), a relação entre os movimentos sociais e a mídia é desigual. "A midia trata os Movimentos Sociais como um OUTRO que ameaça a sociedade. A sociedade que ela, a midia, defende e representa. A relação, portanto, corresponde a lógica da relação entre os que são desiguais estruturalmente", aponta Christa.



Para Joel Felipe Guindani, mestrando em Ciências da Comunicação, pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, e pesquisador das temáticas: Comunicação radiofônica, Midiatização, Movimentos Sociais e MST, os grandes meios dão espaço para os movimentos, contudo, a pauta dos mesmos já está montada, e muitas vezes, essa pauta segue a lógica da espetacularização.

“Há todo um imaginário coletivo de que uma propriedade privada tem a questão da ecologia que é uma questão simbólica de cuidado”, aponta. Houve então, como apresenta Guindani, a construção da notícia se deu, primeiramente, em torno do fato dessa concepção simbólica. “A mídia desperta primeiramente esse reservatório simbólico nas pessoas, que é a questão da violência, da destruição, do capital, da propriedade privada, dos pezinhos de laranja”, explica.

Guindani, diz que midiaticamente o movimento agiu errado, mas ressalta que é preciso também ver pelo lado político da questão histórica do envolvimento dessa empresa (Cultrale) com aquele pedaço. “Então agora resta para o MST ndesconstruir toda essa cultura noticiosa a partir desse fato vai ser muito trabalhoso”, acredita.

Como funciona a comunicação no MST

Segundo Guindani, a questão da comunicação para o movimento se divide em duas linhas:
O movimento tem preocupação de desenvolver meios próprios de comunicação. “Seria o MST e seus veículos, e ,é lógico, que isso envolve o outro lado, que é a questão do MST com os meios de comunicação que não lhe pertence.”

Em outubro de 2006, João Pedro Stédile, um dos principais líderes do movimento, em entrevista ao Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, disse que o movimento aprendeu com os que nos antecederam na luta pela reforma agrária, e que a transformação na sociedade é imprescindível para a construção da autonomia e dos próprios veículos de comunicação, para a constituição de uma voz na sociedade. “Não cultivamos a ilusão de que os veículos de propriedade dos grandes grupos empresariais e do capital nacional e estrangeiro tenham simpatia para conceder espaços para as organizações que questionam o modelo econômico e combatam as injustiças sociais.” Veja a entrevista na íntegra aqui

“Para mim, os movimentos sociais populares permitem imaginar uma utopia possível: são o lugar da vivência e da construção dos desejos e mesclam projetos de libertação e de emancipação. E assim, o ponto de partida do trabalho fica enunciado: ele se inscreve entre aqueles que sonham um mundo melhor”, Christa Berger em Campos em Confronto: A terra e o texto.



Veja abaixo a entrevista concedida pela professora Christa.

Como a senhora vê a relação dos movimentos sociais e a mídia?
Penso que está largamento estudado que a relação é desigual e comprometida. Ou seja, a midia trata os Movimentos Sociais como um OUTRO que ameaça a sociedade. A sociedade que ela, a midia, defende e representa. A relação, portanto, corresponde a lógica da relação entre os que são desiguais estruturalmente.

A que se atribui a criminalização que muitos veículos fazem com movimentos como o MST?
Criminalizando é mais fácil assegurar esse outro lugar que os Movimemtos devem ocupar na percepção do leitor. Por um lado, corresponde ao que o leitor médio pensa e por outro sua visão é reforçada por esse enquadramento. A circularidade entre sociedade e mídia é que, a meu ver,importa detectar e compreender. Os compromissos mútuos, os reforços e os compromissos de não deixar frestas de simpatia aos que lutam ou que pertecem a parcela dos sem parcela da sociedade brasileira.

Como os movimentos podem usar os veículos a seu favor?
Acho dificil, mas os movimentos vêm encontrando estratégias de atuação e ação que podem romper ou pelo menos alterar um pouco a lógica perversa da mídia. Mas é uma questão politica para os Movimentos encontrarem resposta.

*Jornalista e professora, graduada em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, mestre em Ciência Política pela Universidad Nacional Autonoma de Mexico, doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo, tem pós-doutorado em Teorias do Jornalismo na Universidade Autonoma de Barcelona. Professora aposentada da UFRGS, atualmente leciona na Universidade do Vale do Rio dos Sinos e desenvolve pesquisa “A memória no tempo do jornalismo”.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

A internet e os Movimentos Sociais

Vivemos na "era da informação". São muitos os veículos que fazem de sua principal programação a de passar informação. Estamos cada vez mais consumindo tudo o que rola por aí, principalmente na internet. Os públicos são segmentados, variando e fazendo com que as informações sejam das mais catastróficas até as mais bizarras e conflituosas.

Com a tarefa de analisarmos sites e blogs que dizem respeito ao assunto principal do nosso blog Movisol, localizamos três sites sobre os movimentos sociais. O primeiro, o que logo nos fez pensar na análise como um todo, foi o site do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Realizamos nossa primeira grande reportagem para o blog com eles, e ainda temos a lembrança da nossa visita, feita recentemente, ao assentamento em Viamão.



O segundo site escolhido foi o da Via Campesina. O movimento mundial, que envolve pequenos trabalhadores rurais de 56 países, seria nosso primeiro grupo para a inauguração do blog, mas devido a poucos contatos e muitas histórias do MST para contar, resolvemos deixar para depois.



E, para finalizar a análise, o blog do Movimento Negro Unificado. Por ser um movimento social, também decidimos colocar alguma referência online desse movimento que vem combatendo ao longo de sua história todas as manifestações preconceituosas e discriminatórias praticadas contra africanos.


Com a evolução da tecnologia, a rede se torna um dos principais meios de divulgação, ou seja, ela é o suporte para o universo da informação. Para os autores Thalles Waichert e Fábio Malini, a produção industrial da informação entrou em colapso, "entrando em campo" a descentralização da produção midiática, na qual a rede é o principal suporte.

A questão sobre a internet e os blogs é muito discutida devido à veracidade das informações. Até que ponto pode-se acreditar nas informações que são passadas por qualquer pessoa, e a qualquer hora na web? Mas, acredita-se que aquelas páginas com relevante ou divertido conteúdo permaneçam.

O professor e Dr. Bruno Lima Rocha da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) fala do uso da internet pelos movimentos sociais e faz uma breve análise do uso da rede pelos movimentos. "Os movimentos sociais contemporâneos surgem junto com a internet. A questão da internet não é de ela ser utilizada, ela é constitutiva das novas redes dos movimentos populares", apresenta. Para o professor deveriam haver mais canais de retorno. "As mídias sindicais poderiam contar com a participação da categoria. Fazer com que seus trabalhadores e filiados sejam os primeiros que alimentem aquela página, não um grupo de profissionais apenas. "

Confira aqui a entrevista com o professor Bruno.


Para Alex Primo, “multiplicam-se hoje os blogs grupais, organizacionais...”. No caso das nossas três análises, chegamos à conclusão de que todos são sites e/ou blogs organizacionais. Os blogs organizacionais, os coletivos, estão sujeitos a restrições sobre a criação de determinada postagem, e à interação com as audiências. Os redatores do blog, sempre devem levar em consideração que a assinatura será feita pelos membros de certa organização.

Podemos dar um exemplo sobre o site do MST. Toda e qualquer publicação feita no site, não é de interesse pessoal. Todas as informações que ali constam, são de interesse do movimento, que deve estar á par da veracidade dos dados.

O conteúdo analisado, que fala sobre movimento, se encaixa perfeitamente no conceito de Oliveira (2002, p.126) sobre as organizações: são “grupos de pessoas que combinam seus próprios esforços e outros tipos de recursos para alcançar objetivos comuns”. O autor continua caracterizando as organizações de outros grupos sociais (os do blog também): “propósito, divisão de trabalho, coordenação e hierarquia são as principais”.

Primo salienta ainda que para o “estudo de gênero não importa se a organização que mantém o blog tem ou não fins lucrativos, o nível de sua burocratização, nem se é uma organização pública ou privada e se tem registro comercial. Não importa tampouco a dimensão da organização, quantos membros possui, se ela é municipal ou transnacional, se tem filiais, se possui capital e como ele é administrado”.

Enfim, classificamos em subgêneros os blog do Movimento Negro, e os sites do MST e da Via Campesina como organizacional informativo. Este gênero se caracteriza pelo registro de informações sobre o segmento de atuação da organização, sem que ela manifeste seu parecer sobre os fatos.

O site do MST pode ser considerado também organizacional reflexivo. Há espaço para publicações de gente de dentro do Movimento que fala sobre o que acontece na mídia. No da Via Campesina encontramos um espaço para publicações onde o movimento expressa também suas reflexões, podendo enquadrar o site no gênero organizacional reflexivo. E o blog do Movimento Negro tem diversos artigos publicados para o desenvolvimento de suas teorias.


O que mais nos chama a atenção para essas publicações, é que o que vemos nos endereços eletrônicos é totalmente diferente das informações que a mídia divulga. A opinião da mídia sobre o movimento é uma, e o movimento está sempre contra o que a mídia diz e divulga dele.

O que podemos concluir com essa análise dos blogs e sites dos movimentos que abordaremos nas outras matérias, é que há uma preocupação em mostrar os motivos de suas realizações e ideologias. Acessando a internet e conferindo os sites analisados, você poderá saber o outro lado da moeda (não só o que a mídia tradicional apresenta), mas poderá também dosar as informações e formar sua própria opinião.

Informação a gente vai ter sempre, ainda mais com essa evolução da tecnologia que nos permite informar o tempo todo, a quem quisermos. Cabe sempre ao leitor, usuário, internauta, tele-espectador, saber como receber a informação, interpretá-la e levá-la da melhor forma possível.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Só a terra não basta

Fragmentos iniciais

“Só a terra não basta. Lutamos por vários direitos, temos muito para conquistar”, afirma Neiva Vivian, 42 anos, sendo desses, 22 anos dedicados à luta do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST). Essa frase foi dita no encontro que tivemos quando visitamos o Centro Sepé Tiarajú, no assentamento de Viamão.

Centro de Eventos do MST em Viamão


O sol já havia se posto e nós ainda estávamos a caminho do assentamento, uma hora e meia de ônibus, onde deu para entender a analogia que se faz ao pegar o ônibus Viamão lotado. O atraso por conta de alguns percalços. Sem cochilo chegamos até a parada 72, onde Paulo Ricardo Moreira Benevides, integrante do movimento veio nos buscar, um quilômetro a mais e chegamos ao nosso destino.

Terça-feira, cinco da tarde. Quando chegamos estava acontecendo o encontro das mulheres do MST de diversos assentamentos e acampamentos. Enquanto as mulheres discutiam sobre sexualidade, feminilidade, revolução e outros assuntos afins, fomos conhecer o centro, acompanhadas por Paulo. Paulo é casado com Roselaine Peres, e juntamente com sua filha Larissa, estão no Movimento há um ano e três meses.

Patrícia, acampada do MST explica a diferença entre acampamento e assentamento

Há 10 anos com direito garantido à terra/

Um lugar tranqüilo, repleto de referências à luta pela terra, igualdade, fraternidade, amparada na ideologia de outro mundo possível. Enquanto caminhamos, Paulo vai nos dizendo sobre o trabalho, projetos e modo de vida das pessoas que lá vivem.

Como apontou mais tarde Neiva, apesar da questão do acesso a terra ser o fio condutor da luta, ela não é a questão isolada. Educação, inclusão digital (através do telecentro), incentivo à leitura, além do sustento através da plantação do arroz e das árvores frutíferas. Alguns assentados complementam seu sustento com trabalhos fora do assentamento.


Telecentro


No caminho, uma casinha de barro, coberta por um teto de gramas chama a atenção. É a casa da leitura, construída pelos moradores. O espaço reservado para reuniões e leitura, abriga diversos lugares, uma bandeira do movimento e uma foto de Sebastião Salgado, aliás, as fotos de Salgado estão espalhadas por todos os lugares. Futuramente o assentamento contará com uma biblioteca, que será financiada pelo Ministério da Cultura, que aprovou esse projeto encaminhado pelo MST.

Como se fora brincadeira de roda...

Enquanto as mulheres estão em seu encontro, suas crianças ficam num cantinho chamado Ciranda. Lá conhecemos Roselaine, ou Rose, solícita e simpática. Ela ajuda a cuidar das crianças nos dias de evento. Formada em pedagogia, Rose diz que a questão da educação e a informação chamaram sua atenção e fez com que ela aderisse à causa. Apesar de estar envolvida com o movimento, ela ainda mora na cidade por conta de seu outro trabalho.

Ciranda


Nesse dia havia três crianças na Ciranda, fazendo a hora do conto e se revezando com os brinquedos coloridos de montar.

Contribuindo no atendimento às crianças, conhecemos Patrícia Santos, 23 anos, que faz parte da escola itinerante do MST. Ela vive com sua família - esposo e uma filha de dois anos e meio- num acampamento no interior do Estado. Patrícia nos conta que sua mãe já participava do Movimento na tentativa de dar um futuro melhor para sua família, aderiu para a conquista de um pedaço de terra.

Patrícia


No acampamento, Patrícia também leciona para turmas de 1ª a 4ª séries. “As aulas são dadas pelas próprias pessoas do movimento. Vem o pessoal de uma escola que faz a revisão do conteúdo que iremos passar”. De acordo com Patrícia as mulheres se mobilizam mais na questão da educação.

Patrícia explica as atividades das mulheres na educação, dentro do MST

A vida sob lonas...

Lonas, chão batido, luz de velas. É assim o espaço ocupado por Patrícia no acampamento. De manhã ela cuida dos seus afazeres, à tarde vai dar aulas, e à noite volta para sua “casa”, faz a janta, os planejamentos de aula e, finalmente, descansa.

Patrícia se diz uma mulher vaidosa. Adora brincos (apesar do dia não estar usando), unhas pintadas e nos conta que como toda e qualquer mulher, as do acampamento são vaidosas. Nos fala de sua colega Fabiane que por nada nesse mundo tira o salto alto, e mesmo à noite e no escuro (já que lá não há luz elétrica), ela não os tira.

Patrícia fala das vaidades das mulheres do Movimento



Deixando a Ciranda, fomos ao salão para esperar o fim do encontro e, então conversamos com outras mulheres. Mas, antes, passamos na cozinha e conhecemos Neca, 10 anos na militância fazendo a janta – à qual fomos convidadas a provar.

Aos poucos, as mulheres vão saindo da “tenda”, como à definimos. Na verdade se trata de um lugar circundado por paredes “decoradas”, com pinturas sempre ligadas à questões defendidas pela causa. A imagem de Che está presente, tanto no espaço por fora da tenda, quanto das paredes do salão, também enfeitas com fotos de Salgado.

Quando nos aproximamos, elas recuam um pouco, no princípio “ariscas”, para dar uma entrevista. Pensam e até argumentam a questão da grande imprensa. “Na verdade a gente sabe que os grandes meios são contra o Movimento. Nós nunca vamos esperar que eles façam algo à favor”, explica Delvane Frosul, 27 anos, dos quais 24 ligadas ao MST. Ela foi uma das primeiras mulheres a conversarem conosco. Formada em magistério dentro do movimento, casada há cinco anos, ela espera seu primeiro filho que deve chegar daqui há seis meses.

Ela trabalha no Cooperativa Central dos Assentamentos do RS (COCEARGS), o que faz com que passe a semana em Porto Alegre e volte para Jóia, onde fica o seu acampamento, aos finais de semana.

Estranhas no ninho, ficamos a observar o movimento das mulheres que não pararam por um minuto. E entre um olhar e outro, Neiva Vivian vem conversar conosco. Aos seus 42 anos, 22 na causa, essa senhora, simpática, nos fala porque e como se deu o seu encontro. “Meus cunhados estavam no acampamento e achei que poderia ser uma saída para criar condições de vida”, conta. Mãe de dois filhos, um de 23 (que no momento cursa medicina em Cuba – ponto que será abordado na próxima matéria) e outro de 17, Neiva acredita que uma das causas de dificuldades enfrentadas pelo movimento esteja no modelo atual da sociedade, que segundo ela, é voltada para o capital, agronegócio, concentração da terra. Para ela essa é uma realidade que o movimento quer mudar. “Nós queremos levar a consciência de não pensar só em si. Só terra não basta. Lutamos por vários direitos, temos muito para conquistar”.

E como vimos, há a democratização da comunicação-informação, a leitura, a inclusão digital e tantos outros bens comuns e básicos que deveriam ser de direito à todos.

Para ver mais fotos e mais vídeos, acesse os links à direita do blog.